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Voltar Cota de aprendizagem não pode ser alterada por norma coletiva, decide magistrada da 23ª Região (MT)

Sindicatos de motoristas e de empresas de transporte de Mato Grosso estão proibidos de firmarem acordos ou convenções coletivas que alterem a base de cálculo da cota de aprendizagem. A determinação vale para a Federação dos Trabalhadores em Transporte Rodoviário do Estado, assim como para outras cinco entidades sindicais que atuam em Cuiabá, Rondonópolis, Barra do Garças e no Vale do São Lourenço.

A decisão é da juíza Karina Rigato, titular da Vara do Trabalho de Alto Araguaia (MT), em ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) questionando cláusula de convenção coletiva (CCT) que excluiu a função de motorista profissional da base de cálculo da cota para contratação de aprendizes.

Prevista no artigo 429 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), essa contratação é obrigatória para estabelecimentos de qualquer natureza e envolve um contrato de trabalho especial, por no máximo dois anos, para jovens de 14 e a 24 anos inscritos em programa de formação técnico-profissional. A norma estabelece que o número de aprendizes deve ser de 5%, no mínimo, e 15%, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada empresa, cujas funções demandem formação profissional.

Validade da norma coletiva

Ao se defenderem, os sindicatos sustentaram a validade das normas coletivas, garantida na Constituição Federal, e argumentaram ser inviável o cumprimento da cota nos moldes apontados pelo MPT devido à falta de interessados. Segundo as entidades, não é possível preencher o número de candidatos do programa de aprendizagem por conta da exigência que o motorista profissional tenha ao menos 21 anos de idade, sendo inviável colocar todos os aprendizes no setor administrativo das empresas.

Quanto ao primeiro argumento, a juíza apontou que o princípio da autonomia sindical não autoriza transacionar a base de cálculo da cota porque, apesar de a Constituição Federal garantir o respeito às normas coletivas, esse princípio não é ilimitado. Uma dessas restrições se refere justamente à questão discutida, já que há proibição, inscrita no artigo 611-B da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de que acordos ou convenções coletivas suprimam ou reduzam alguns direitos específicos, dentre eles o de proteção a crianças e adolescentes, como é o caso da Lei da Aprendizagem.

Ela também esclareceu que a atividade de motorista no setor de transporte terrestre é computável na base de cálculo da cota de contratação de aprendizes, havendo previsão expressa na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) quanto ao cômputo dessa atividade.

Cumprimento alternativo

A magistrada reconheceu, todavia, a dificuldade para se preencher a cota em questão, tanto pela restrição legal da idade para a atuação do aprendiz na atividade de motorista ou seu auxiliar, quanto pela falta de interesse dos jovens no trabalho administrativo, já também diminuto e incapaz de comportar todos.

Entretanto, salientou que exatamente para situações com esse tipo de obstáculos, a legislação possibilita o seu cumprimento alternativo por meio da cota social. Trata-se de um dispositivo instituído em 2016 pelo Decreto 8.740, destinado especialmente àquelas empresas que exercem atividades que possam dificultar a contratação de aprendiz, como as que envolvem ambientes insalubres e perigosos.

A cota social permite que a empresa contrate o aprendiz, mas este realize as atividades práticas em local diferente, na chamada entidade concedente. Para isso, é preciso que seja firmado um termo de compromisso com o Ministério do Trabalho, a empresa contratante, a entidade responsável pelo curso de formação e a entidade onde serão realizadas as aulas práticas.

Ainda sobre a lei de aprendizagem, a magistrada enfatizou que não se pode perder de vista que o seu objetivo é o de promover a qualificação e inclusão socioeconômica e, ao observá-la, a empresa está cumprindo sua função social de “gerar emprego, renda e fomentar a qualificação de jovens para inserção no mercado de trabalho, da qual poderá se beneficiar no futuro, ela própria ou seus clientes, escopo que seria esvaziado ao se flexibilizar a base de cálculo da cota em referência.”

Obrigações e dano coletivo

Por todas essas razões, a juíza confirmou decisão dada anteriormente, em caráter liminar, determinando às entidades que se abstenham de celebrar acordos ou convenções coletivas que flexibilizem ou alterem a base de cálculo da cota legal de aprendizagem e que reduzam as medidas de proteção legal de crianças e jovens. Em caso de descumprimento, fixou multa de 50 mil reais para cada ente sindical.

Por fim, reconheceu o dano moral coletivo causado pela lesão que atingiu não só as pessoas que deixaram de trabalhar durante a vigência da norma questionada, quanto toda a sociedade que não teve a inclusão e profissionalização de seus jovens.

Como reparação, arbitrou a quantia de 150 mil reais, a ser paga solidariamente pela Federação e os outros cinco sindicatos. O montante deverá ser destinado a projetos sociais de instituições públicas ou privadas sem fins lucrativos, especialmente aquelas ligadas à profissionalização de jovens e adolescentes.

Fonte: TRT da 23ª Região (MT)

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