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Voltar Acolhido pedido de indenização feito por trabalhadora brasiliense discriminada por ser mulher

Decisão é da 4ª Vara do Trabalho de Brasília (DF)

19/08/2021 - A juíza Katarina Roberta Mousinho de Matos Brandão, em exercício na 4ª Vara do Trabalho de Brasília (DF), acolheu pedido de indenização por danos morais feito por uma trabalhadora discriminada em seu ambiente de trabalho, por seu superior hierárquico, por ser mulher. De acordo com a autora da reclamação – que trabalhava como líder de operações -, seu coordenador dizia que gestão de equipe não era coisa para mulheres. Na sentença, a magistrada lembra que a proteção à mulher contra discriminação tem estatura constitucional, é que é dever do Judiciário efetivar essa proteção.

Admitida em janeiro de 2016 como líder de operações, a trabalhadora conta na inicial que era humilhada em seu local de trabalho pelo coordenador. Além de sempre apontar defeitos em seu trabalho, com reclamações e críticas na frente de todos, o coordenador teria dito que a equipe não era boa porque era coordenada por uma mulher, e que mulher não servia para coordenar equipes. Ela diz que chegou a pedir demissão, mas foi convencida a permanecer no emprego pelo supervisor. Contudo, alega que continuou passando situações vexatórias com o coordenador, que seguia dizendo que gestão não era coisa para mulher. Diante desse cenário, a trabalhadora acionou a justiça requerendo indenização por danos morais.

Em defesa, a empresa afirma que a trabalhadora atuava como líder em um ambiente predominantemente masculino, o que demonstra que valoriza a diversidade entre seus colaboradores. Diz que recebia feedbacks negativos, mas que estava satisfeita com o trabalho da autora da reclamação, que só foi demitida em razão da perda de um contrato por causa da pandemia.

Legislação

De acordo com a magistrada, a proteção das empregadas contra discriminação tem estatura constitucional, estando presente nos artigos 1º (incisos III e IV), 3º (inciso IV), 5º (inciso XLI) e 7º (incisos XXX e XXXI). Nesse sentido, ressaltou que o Brasil é signatário da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, que prevê, em seu artigo 7º, a obrigação de adotar medidas que proíbam toda discriminação contra a mulher e a estabelecer proteção jurídica dos direitos da mulher em base de igualdade com o homem, garantindo, “por meio dos tribunais nacionais competentes e de outras instituições públicas, a proteção efetiva da mulher contra todo ato de discriminação”, tomando medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra a mulher praticada por qualquer pessoa, organização ou empresa.

O combate à discriminação contra a mulher também é tema da Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, de 1994, lembrou a magistrada. O documento diz que violência contra a mulher é qualquer conduta baseada no gênero, que causa morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada. Já a Convenção nº 111 da OIT afirma que “todo e qualquer tratamento desigual, de caráter infundado, em matéria de emprego ou profissão, que dificulte ou obstaculize o acesso e permanência no emprego, a oportunidade de ascensão e formação profissional, a igualdade remuneratória, bem como promova a violência e o assédio, constitui discriminação”.

Ainda de acordo com a magistrada, a discriminação contra a mulher foi incluída como tipo penal no Código Penal Brasileiro. Segundo o artigo 147-B, é crime “causar dano à mulher que a prejudique e perturbe seu pleno desenvolvimento emocional ou que vise a degradar ou a controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à sua saúde psicológica e autodeterminação”. A pena prevista é de reclusão, de seis meses a 2 anos, e multa, se a conduta não constituir crime mais grave.

Fatores histórico/culturais

Entretanto, revelou a magistrada, mesmo com esse vasto arcabouço normativo, fatores históricos e culturais enraizados na nossa sociedade patriarcal perpetuam a discriminação contra a mulher, com a adoção do estereótipo de que existem trabalhos de homens e trabalhos de mulheres e que trabalho de homem vale mais do que trabalho de mulher. “Essa divisão fica ainda mais evidente quando as mulheres se inserem em atividades ou profissões tipicamente masculinas, como no presente caso, de modo que, como discurso que naturaliza a hegemonia masculina não se mostra suficiente, busca-se desqualificar as mulheres que rompem essa barreira, por meio de discriminações indiretas e pela prática de assédio”.

No caso em análise, a juíza salientou que testemunha ouvida nos autos disse que percebeu haver implicância com a autora da reclamação por parte do coordenador, e que “transparecia” haver preconceito para com a líder pelo fato de ela ser mulher. Disse, por fim, que a autora da reclamação e sua equipe eram realmente motivo de chacotas e fofocas.

Como a empresa mesmo afirmou que recebeu feedbacks negativos – o que demonstra que algo estava errado –, devia provar que tomou ativamente medidas necessárias para evitar ou coibir agressões decorrentes do fato da autora da reclamação ser a única mulher trabalhando em um ambiente predominantemente masculino, como admitido na defesa.  O superior hierárquico tratava a trabalhadora de forma vexatória e humilhante, reiteradamente, atentando contra sua dignidade, ocasionando profundo abalo psicológico, e a conduta empresarial foi omissa, pois não procurou apurar de forma célere e eficaz os episódios narrados pela trabalhadora, fortalecendo a atitude do assediador e tratando a autora da reclamação de forma discriminatória.

Assim, “diante da inércia da empresa em solucionar as agressões psicológicas relatadas pela autora e comprovadas pela testemunha, corroboradas com o fato admitido pela defesa de que ela era a única mulher trabalhando em um ambiente masculino, está caracterizado o ato ilícito ensejador do dano moral”, concluiu a magistrada ao deferir o pleito de pagamento de indenização por danos morais em razão da discriminação de gênero.

Fonte: TRT da 10ª Região (TO/DF)

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